As minhas ovelhas ouvem a minha voz, e eu conheço-as, e elas me seguem; E dou-lhes a vida eterna, e nunca hão de perecer, e ninguém as arrebatará da minha mão.
João 10:27-28
“Minhas ovelhas”, diz Cristo, “ouvem minha voz, e eu as conheço-as, e elas me seguem; e eu dou-lhes a vida eterna, e elas nunca hão de perecerão”. Oh, Escrituras benditas! Que nos chama ao dever de termos uma lembrança fiel e cravar seu teor: As ovelhas de Cristo jamais perecerão.
“Estaria Cristo se referindo a uma parcela de seus eleitos ou todos?” você pergunta. Eu defendo e afirmo, crendo de todo coração: A passagem refere-se a todos, sem exceção, e não a uma parcela como alguns sustentam de maneira totalmente ímpia. Confesso e creio veementemente nunca perecerá um sequer deles, e digo isso com autoridade pelo texto em que o próprio Cristo afirmou: Ele disse que se fora possível, até os eleitos seriam enganados. Repare, não é possível eles serem enganados, pereçam ou sejam condenados: Portanto, quem quer que afirme que pode haver algum (isto é, qualquer um dos eleitos) perdido, afirma também que Cristo tem um corpo dilacerado. [1]
A preciosa carta de retratação está assim escrita: “Uma Carta à Congregação aos que creem no Livre-Arbítrio, por alguém que tinha sido dessa doutrina, mas que agora saiu, e agoraé um Prisioneiro da Religião”: cuja inscrição será a seguir, em seu devido tempo e lugar, fornecendo-nos uma observação digna de toda importância.
John Wesley, um Amigo de Roma?
Para ocupar o lugar do argumento, foi alegado que “o Sr. Wesley é um homem velho”, a Igreja de Roma é ainda mais velha que ele. É por isso que exageros, seja da mãe ou do filho, devem passar sem castigo?
Também foi dito que “o Sr. Wesley é um homem muito trabalhador”, presumo que não seja mais trabalhador do que um certo ser ativo, que se diz ir e vir na terra e andar para cima e para baixo nela, [2] nem mais trabalhador, imagino, do que certos sectários antigos, a respeito dos quais foi dito há muito tempo: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! pois que percorreis o mar e a terra para fazer um prosélito”³. E, de maneira nenhuma, tão trabalhador como um membro cuidadoso da comunidade que de suas várias ações é conhecido publicamente: “A verdade da seguinte instância pode depender: de um homem pobre, com uma família numerosa, que exclama “olha o leite” todas as manhãs, em Lothbury e na vizinhança do Royal Exchange; às onze, ele anda com um carrinho de batatas; a uma hora da tarde, ele limpa sapatos; depois do jantar, volta a exclamar “olha o leite” novamente; à noite, vende espadilhas; e no final da noite termina a medida de seu trabalho como vigia.” [4]
A Briga é com o Lobo
O Sr. Sellon, além disso, me lembra que, “enquanto os pastores estão brigando, o lobo entra no rebanho das ovelhas”; não é impossível, mas acontece que a presente briga não está entre “os pastores”, mas com o próprio “lobo”; essa “briga” é justificada por toda mansidão e fidelidade pastoral.
Mas me disseram que, enquanto estou “repreendendo os arminianos, Roma e o diabo riem por trás”. Admitindo que o Sr. Sellon possa derivar essa anedota da essência da fonte, dos próprios grupos inclusive, no entanto, como nem eles nem ele são muito conspícuos pela veracidade, interpreto a inteligência pela regra do inverso, embora autenticada pelo depoimento de sua confiança e amado primo e conselheiro.
Mais uma vez: sou acusado de “excessiva arrogância e do orgulho majestoso”; e por que não acusado de ter sete cabeças e dez chifres e uma cauda do tamanho de uma corda de sino? Afinal, o que meu orgulho ou minha humildade têm a ver com o argumento em questão? Se sou arrogante ou manso, não tem mais consequências para isso ou para o público, assim como se sou uma pessoa alta ou baixa: no entanto, neste exato momento, estou dando uma prova de que meu “orgulho majestoso” pode se humilhar; até para ventilar as impertinências do Sr. Sellon.
Arminianismo em Casa, em Roma
Mas, por mais frívolas que sejam tais acusações, seus princípios são da natureza e tendência mais perniciosas. Devo repetir, o que já parece ter lhe ofendido tanto: que o arminianismo “veio de Roma e o leva para lá novamente”. Juliano, bispo de Eclana, contemporâneo e discípulo de Pelágio, foi um dos que se esforçaram, com muita arte, para dourar as doutrinas daquele herege, a fim de torná-las mais vistosas e palatáveis. O sistema pelagiano, assim envernizado e paliativo, logo começou a adquirir o nome mais suave do semipelagianismo. Vamos vê-lo, atraído por nossas mãos pelo célebre Sr. Bower, que ele próprio, em geral, um pelagiano professo e, portanto, menos propenso a nos apresentar um retrato desfavorável do sistema que ele aprovava. Entre os princípios dessa seita, são os seguintes:
- “A noção de eleição e reprovação, independente de nossos méritos ou deméritos, está mantendo uma necessidade fatal, é a ruína de todas as virtudes e serve apenas para deixar os bons homens negligenciarem sua salvação e levar os pecadores ao desespero.”
- “Os decretos de eleição e reprovação são posteriores a, e em consequência de, nossas boas ou más obras, conforme previsto por Deus desde toda a eternidade.” [5]
Não é essa também a própria persuasão do arminianismo moderno? Os partidários dessa doutrina não argumentam nos mesmos termos idênticos? Deveria ser dito: “Verdade, isso prova que o Arminianismo é Pelagianismo revivido; mas não prova que as doutrinas do arminianismo sejam originalmente papistas.” A atenção diligente, de um momento, deixará claro que são.
Vamos ouvir novamente o Sr. Bower, que, após a passagem citada, acrescenta imediatamente:
Nessas duas últimas proposições, os jesuítas encontraram todo o seu sistema de graça e livre-arbítrio; concordando nisto com os semipelagianos, contra os jansenistas e Santo Agostinho. [6]
Sr. Bower
Os jesuítas foram moldados em um corpo regular, em meados do século XVI: no final do mesmo século, Arminius começou a infestar as igrejas protestantes. Portanto, não precisa de grande penetração, discernir de que fonte ele tirou seu veneno. Sua viagem a Roma (apesar de Monsicur Bayle se interessar em esclarecer as inferências que nela eram deduzidas naquele momento) não foi à toa. Se, no entanto, alguém está disposto a acreditar, que Arminius absorveu suas doutrinas dos socinianos na Polônia, com quem, é certo, ele estava em amizade íntima, não tenho objeção a dividir a diferença: ele pode importar alguns dos seus princípios dos irmãos racovianos, e ainda ser grato, por outros, aos discípulos de Loyola.
Papistas e Predestinação
É certo que o próprio Arminius era consicente de quão grandemente a doutrina da predestinação amplia a distância entre o protestantismo e papismo., ele afirma:
Não há nenhum ponto de doutrina ao qual os papistas, os anabatistas e os (novos) luteranos se opõem mais ferozmente, nem por meio dos quais eles acumulam mais descrédito nas igrejas reformadas e trazem o próprio sistema reformado para mais ódio; pois eles (isto é, os papistas etc.) afirmam que nenhuma blasfêmia contra Deus pode ser pensada ou expressa, além da que está contida na doutrina da predestinação. [7]
Jacob Arminius
Por essa razão, ele aconselha o mundo reformado a descartar a predestinação de seus credos, a fim de que eles possam viver em termos mais fraternos com os papistas, os anabatistas, e assim por diante.
Os escritores arminianos não se preocupam em apreender e vender os argumentos um do outro, como propriedade comum. Portanto, Samuel Hoord copia de Van Harmin a mesma observação que citei agora.
A predestinação é uma doutrina odiosa para os papistas, abrindo suas bocas sujas contra a Igreja e a religião.” [8]
Samuel Hoord
Consequentemente, nossa adoção de doutrinas opostas da graça universal e do livre-arbítrio nos levaria a calá-los por nos conduzir a tantos graus mais perto dos papistas, fazendo eles nos considerarem, pelo menos até aqui, como seus próprios irmãos ortodoxos e queridos: daí resulta que “o arminianismo veio de Roma e ele leva para lá novamente”.
Os Jesuítas e a Predestinação
Se o veredicto conjunto do próprio Arminius e de seu prosélito inglês Hoord não mudar a escala, vamos adicionar o testemunho de um jesuíta professo, como forma de ganhar peso total. Quando os documentos do arcebispo Laud foram examinados, uma carta foi encontrada entre eles, endossada com a mão do prelado: “Março de 1628. Carta de um jesuíta, enviada ao Reitor de Bruxelas, sobre o Parlamento que se seguiu”. O objetivo desta carta era dar ao Superior dos Jesuítas, então residente em Bruxelas, um relato da postura dos assuntos civis e eclesiásticos na Inglaterra; um extrato dele me juntarei aqui:
“Pai Reitor, não permita que a desesperança se apodere de sua alma ardente e zelosa, ao apreender o chamado inesperado de um Parlamento. Agora temos muitas cordas para o nosso arco. Nós plantamos essa medicação sobrenatural [chamada] Arminianismo, que esperamos que purifique os protestantes de sua heresia; e floresce e dá frutos no devido tempo. Para uma melhor prevenção dos puritanos, os arminianos já fecharam os ouvidos duque (de Buckingham); e temos aqueles de nossa religião, que permanecem continuamente na câmara do duque, para ver quem entra e sai: não podemos ser muito cautelosos e cuidadosos a esse respeito. Neste momento, sou carregado de alegria para ver como todos os instrumentos e meios, tanto grandes quanto menores, cooperam de acordo com nossos propósitos. Mas, voltando ao principal ponto: NOSSA FUNDAÇÃO É O ARMINIANISMO. Os arminianos e projetores, como aparecem na essência, geram a mudança. Isso é o que utilizamos por argumentos.” [9]
A Soberana Medicação, Arminianismo
A “medicação soberana, isto é, o arminianismo”, que dizia o jesuíta: “Nós (ou seja, nós, papistas) plantamos” na Inglaterra, de fato fez uma oferta justa “para purgar efetivamente nossa Igreja Protestante”. Quão alegremente o papado e o arminianismo, na época, dançavam de mãos dadas, podem ser aprendidos com Tindal:
As igrejas eram adornadas com pinturas, imagens, peças de altar, etc., e, em vez de mesas de comunhão, eram feitos alterares, e reverências a eles e aos elementos sacramentais exigidos. A doutrina da predestinação era proibida, não apenas para ser pregada, mas para ser impressa; e o sentido arminiano dos artigos foi incentivado e propagado. [10]
Tindal
O jesuíta, portanto, não exultava sem razão. A “medicação soberana”, tão recentemente “plantada”, de fato se enraizou profundamente e produz frutos, sob os auspícios de Charles e Laud. Heylyn também reconhece, que o estado das coisas foi realmente descrito por outro jesuíta daquela época, que escreveu:
O protestantismo se cansa de si mesmo. A doutrina (pelos arminianos, que então estavam no comando) é alterada em muitas coisas, pelas quais seus progenitores abandonaram a Igreja de Roma: como limbus patrum (purgatório); oração pelos mortos e possibilidade de guardar os mandamentos de Deus; e a descrição do calvinismo como heresia, pelo menos, se não traição. [11]
Arminianismo do Inferno
A sustentação dessas posições, pela parte divina da Corte, era de fato uma “alteração”; que o abandonado Heylyn atribui à “engenhosidade e moderação encontradas em alguns professores de nossa religião“. Se resumirmos as evidências que foram dadas, descobriremos que o Arminianismo veio da Igreja de Roma e leva de volta ao poço onde foi escavado.
Notas:
[1] Stryp, u.s.
[2] Jó 1:7, 1 Pe 5:8;
[3] Mateus 23:15
[4] Bath Choniele, 1772
[5] História dos Bispos de Bower (vol. 1), p. 350
[6] Jansenitas: Seguidores de Jasen, teólogo católico antipelagiano (séc. XVI e XVII)
[7] Bower, Ibid
[8] Hoord In Bishop Davenant’s Animadversions Camb. 1641
[9] Hidden works of darkness, p. 89, 90 (1645)
[10] Tindal’s Contin of Rapin, vol. 3, 1758.
[11] Life of Laud, p. 238
Texto traduzido do original “Arminianism is The Road to Rome” de Augustus Toplady. Citações escriturísticas a partir da Almeida Corrigida Fiel © 2020, Traduzido por Elnatan Rodrigues. Para o uso correto deste recurso visite nossa Página de Permissões.