A Primeira Confissão Fora da Europa
A Reforma na Alemanha. Após as várias transformações no final do século XV, com as grandes navegações, o humanismo e o renascimento, a Igreja estava pronta para mudanças. Influenciado por estas transformações que já vinham ocorrendo na Europa e por um sentimento de decepção, Martinho Lutero (1483-1546) um monge agostiniano, indignado com a postura teológica, moral e espiritual da igreja católica romana e com a venda de indulgências por Johann Tetzel (1465-1519), em 1517 fixou suas 95 teses na porta do Castelo de Wittenberg. Este era um ato que convocava a igreja para um debate e não para uma divisão. Infelizmente, a igreja não lhe dera ouvidos e em consequência de suas ações, o Papa Leão X (1478-1521) excomungou Lutero. Mas pela graça de Deus, a Reforma já havia iniciado.
A Reforma e seus desdobramentos. Como já foi mencionado acima, as transformações que já estavam ocorrendo na Europa foram fundamentais e agora com as ações de Lutero frente à igreja católica, a Europa e o mundo nunca mais foram os mesmos, pois houveram transformações sociais significativas na política, na ética, na educação, na economia e principalmente da relação entre o Estado e a Igreja. E em seus desdobramentos, além da Alemanha, a reforma religiosa espalhou-se por vários países, como por exemplo na Suíça, França, Inglaterra, Escócia, Holanda, Escandinávia, Polônia, Hungria, Espanha, entre outros. “Embora cada um deles tenha exibido características próprias distintivas, todos lidaram com questões teológicas, morais, políticas e eclesiásticas subjacentes comuns, permitindo certa unidade dentro da diversidade”. [1]
A primeira tentativa de reforma no Brasil. A reforma protestante também chegou ao Brasil. Porém, não restam dúvidas de que o Brasil foi colonizado por uma nação fortemente católica, Portugal:
Dentre as principais forças que personificaram a Contrarreforma, estava a Companhia de Jesus, ordem religiosa fundada por Inácio de Loiola em 1534, em Paris. Os jesuítas, como eram chamados os membros da ordem Companhia de Jesus, tinham na obediência ao papa, na expansão da igreja católica e no combate ao protestantismo seus princípios centrais. Como resultado, o Brasil tornou-se um dos seus principais campos missionários, fosse para expandir a fé católica, na colônia, fosse para impedir que os protestantes aqui lançassem raízes no recente território português. [2]
Essa ordem, dos jesuítas, teve um papel de destaque na expansão da fé católica no Brasil:
Num primeiro momento, essa ordem atuou no país durante 210 anos (1549-1759), exercendo grande influência sobre a formação religiosa e cultural do povo brasileiro. Os jesuítas se dedicaram à pregação religiosa da fé católica e ao trabalho educativo.[3]
Dessa forma, o Brasil se tornou a maior nação católica do mundo. Mas isso não impediu que o Brasil fosse alvo de ações missionárias protestantes. O Desastre de Guanabara. No ano de 1555, chegou ao Brasil, no Rio de Janeiro uma expedição francesa como uma tentativa de implantação de uma colônia protestante. Essa expedição foi comandada pelo vice-almirante francês Nicolas Durand de Villegaignon (1510-1571) de origem católica, e que inicialmente havia aderido à reforma e o almirante protestante Gaspard II de Coligny (1519-1572). Eles se fixaram na Baía da Guanabara. Villegaignon teria escrito ao reformador João Calvino (1509-1564), que vivia em Genebra, solicitando o envio de pastores protestantes. Entusiasmado com o projeto:
Calvino enviou uma segunda expedição, composta de um pequeno grupo de calvinistas, liderados pelos pastores Pierre Richier e Guillaume Chartier. Um dos membros dessa comitiva, que chegou ao Brasil em 7 de março de 1557, foi Jean de Léry, que mais tarde escreveria o livro História de uma Viagem à Terra do Brasil, publicado em Paris, em 1578. [4]
Sem muita demora, três dias após a chegada desse pequeno grupo, no dia 10 de março de 1557 foi realizado o primeiro culto protestante no Brasil e das Américas. O sermão estava baseado em Salmo 4:27:
Uma coisa peço ao Senhor, e buscarei: que eu possa morar na Casa do Senhor todos os dias da minha vida, para contemplar a beleza do Senhor e meditar no seu templo. (RA)[5]
Este sermão, provavelmente foi pregado, em razão da longa viagem que lhes ocorreram, assim como do cuidado de Deus. Lamentavelmente, pouco tempo depois da chegada de Jean Cointac, Villegaignon foi fortemente influenciado por este ex-dominicano. E dessa forma passou a entrar em desentendimento com os pastores calvinistas acerca dos sacramentos e em vários pontos teológicos. Concordo plenamente com Paulo Ferreira quando ele diz que “Villegaignon estava revelando seu verdadeiro caráter. Ele nunca havia se convertido à fé reformada” (Ferreira 2017).
Em razão dessa divergência, Villegaignon proibiu que os reformadores celebrassem a eucaristia, pregações e por fim as reuniões de oração. E como era de se esperar, os colonos protestantes foram expulsos da pequena ilha e eles retornaram para Genebra em 1558 em um navio que estava indo para França. Porém, como nos conta a história, o navio em que eles estavam ameaçou naufragar, e mesmo com risco de morte, cinco deles se ofereceram para retornar à terra seca. Dentre eles estavam Jean de Bourdel, Matthieu Verneuil, Pierre Bourdon, André Lafon e Jacques Le Balleur. E como era de se esperar, ao pisarem em terra seca, foram aprisionados. Villegaignon lhes apresentou uma série de questionários teológicos e ordenou que estes homens respondessem sobre tais questões em um documento dentro de apenas doze horas. Em razão disso, eles escreveram um documento, que ficou conhecido como a Confissão de Fé da Guanabara (1558). Este documento custaram as suas próprias vidas:
Diante da recusa dos calvinistas em abjurar as suas convicções, Villegaignon condenou-os à morte. Jean de Bourdel, Matthieu Verneuil e Pierre Bourdon permaneceram irredutíveis em suas convicções religiosas, e foram estrangulados e lançados ao mar. André Lafon, o único alfaiate da Colônia, foi poupado sob a condição de que não divulgasse as suas ideias religiosas. Jacques Le Balleur conseguiu se retirar para a cidade de São Vicente. Porém, lá foi preso e enviado para a cidade de Salvador, na Bahia, onde ficou preso durante nove anos. Em 1567, após a expulsão do país de todos os franceses, o governador geral Mem de Sá levou-o para o Rio de Janeiro, onde ele foi enforcado. [6]
Foi dessa forma, tão trágica que se encerrou o primeiro projeto de implantação da fé e de igrejas reformadas no Brasil. Contudo, apesar deste triste desfecho, a presença destes protestantes calvinistas em solo brasileiro foi importantíssimo. Este trabalho missionário na América Latina abriu portas para que outros projetos de evangelização de caráter protestante acontecesse em terras brasileiras, assim como em todo o mundo. A Confissão de fé de Guanabara, um importante documento. A Confissão de Guanabara ou Confissão Fluminense é um importantíssimo documento para a história da igreja no Brasil. Seu Memorial se encontra na Escola Naval da Marinha, no Rio de Janeiro. Lá encontra-se nas placas os dezessetes parágrafos da Confissão. Conteúdo da Confissão. A Confissão, como dito acima, contém dezessete parágrafos e teria sido originalmente escrito em latim. Jean Du Bourdel pode ter sido o seu redator por ser o mais culto e preparado dentre os cinco. A Confissão aborda a natureza do Pai, do Filho e do Espírito Santo, a volta de Cristo, a Santa Ceia, o batismo, o livre-arbítrio, imposição de mãos, casamento, divórcio, castidade entre outros. Os autores desta Confissão, frequentemente recorrem a autoridade dos apóstolos, Cipriano (ca. 210-258), Ambrósio (ca. 333-297) e Agostinho (354-430). Veja na integra o texto da Confissão:
Confissão de Fé da Guanabara
Segundo a doutrina de S. Pedro Apóstolo, em sua primeira epístola, todos os cristãos devem estar sempre prontos para dar razão da esperança que neles há, e isso com toda a doçura e benignidade, nós abaixo assinados, Senhor de Villegaignon, unanimemente (segundo a medida de graça que o Senhor nos tem concedido) damos razão, a cada ponto, como nos haveis apontado e ordenado, e começando no primeiro artigo:
I. Cremos em um só Deus, imortal, invisível, criador do céu e da terra, e de todas as coisas, tanto visíveis como invisíveis, o qual é distinto em três pessoas: o Pai, o Filho e o Espírito Santo, que não constituem senão uma mesma substância em essência eterna e uma mesma vontade; o Pai, fonte e começo de todo o bem; o Filho, eternamente gerado do Pai, o qual, cumprida a plenitude do tempo, se manifestou em carne ao mundo, sendo concebido do Santo Espírito, nasceu da virgem Maria, feito sob a lei para resgatar os que sob ela estavam, a fim de que recebêssemos a adoção de próprios filhos; o Santo Espírito, procedente do Pai e do Filho, mestre de toda a verdade, falando pela boca dos profetas, sugerindo as coisas que foram ditas por nosso Senhor Jesus Cristo aos apóstolos. Este é o único Consolador em aflição dano constância e perseverança em todo bem. Cremos que é mister somente adorar e perfeitamente amar, rogar e invocar a majestade de Deus em fé ou particularmente.
II. Adorando nosso Senhor Jesus Cristo, não separamos uma natureza da outra, confessando as duas naturezas, a saber, divina e humana nele inseparáveis.
III. Cremos, quanto ao Filho de Deus e ao Santo Espírito, o que a Palavra de Deus e a doutrina apostólica, e o símbolo, nos ensinam.
IV. Cremos que nosso Senhor Jesus Cristo virá julgar os vivos e os mortos, em forma visível e humana como subiu ao céu, executando tal juízo na forma em que predisse no capítulo vinte e cinco de Mateus, tendo todo o poder de julgar, e Ele dado pelo Pai, sendo homem. E, quanto ao que dizemos em nossas orações, que o Pai aparecerá enfim na pessoa do Filho, entendemos por isso eu o poder do Pai, dado ao Filho, será manifestado no dito juízo, não todavia que queiramos confundir as pessoas, sabendo que elas são realmente distintas uma da outra.
V. Cremos que no santíssimo sacramento da ceia, com as figuras corporais do pão e do vinho, as almas fiéis são realmente e de fato alimentadas com a própria substância do nosso Senhor Jesus, como nossos corpos são alimentados, e assim não entendemos dizer que o pão e o vinho sejam transformados ou transubstanciados no seu corpo, porque o pão continua em sua natureza e substância, semelhantemente ao vinho, e não há mudança ou alteração. Distinguimos, todavia, este pão e vinho do outro pão que é dedicado ao uso comum, sendo que este nos é um sinal sacramental, sob o qual a verdade é infalivelmente recebida. Ora, esta recepção não se faz senão por meio da fé e nela não convém imaginar nada de carnal, nem preparar os dentes para comer, como Agostinho nos ensina dizendo: “Porque preparas tu os dentes e o ventre? Crê, e tu o comeste”. O sinal, pois, nem nos dá a verdade, nem a coisa significada; mas Nosso Senhor Jesus Cristo, por seu poder, virtude e bondade, alimenta e preserva nossas almas, e as faz participantes de sua carne, e de seu sangue, e de todos os seus benefícios. Vejamos a interpretação das palavras de Jesus Cristo: “Este pão é meu corpo”. Tertuliano, no livro quarto contra Marcia, explica estas palavras assim: “esse é o sinal e a figura do meu corpo”. S. Agostinho diz: “O Senhor não evitou dizer: – Este é o meu corpo, quando dava apenas o sinal de seu corpo”. Portanto (como é ordenado no primeiro cânon do Concílio de Nicéia), neste santo sacramento não devemos imaginar nada de carnal e nem nos distrair no pão e no vinho, que nos são neles propostos por sinais, mas levantar nossos espíritos ao céu para contemplar pela fé o Filho de Deus, nosso Senhor Jesus, sentado à destra de Deus, seu Pai. Neste sentido podíamos jurar o artigo da Ascensão, com muitas outras sentenças de Santo Agostinho, que omitimos, temendo ser longas.
VI. Cremos que, se fosse necessário pôr água no vinho, os evangelistas e São Paulo não teriam omitido uma coisa de tão grande consequência. E quanto ao que os doutores antigos têm observado (fundamentando-se sobre o sangue misturado como água que saiu do lado de Jesus Cristo, desde que tal observância não tem fundamento na Palavra de Deus, visto mesmo que depois da instituição da Santa Ceia isso aconteceu), nós não podemos hoje admitir necessariamente.
VII. Cremos que não há outra consagração senão a que se faz pelo ministro, quando se celebra a ceia, recitando o ministro ao povo, em linguagem conhecida, a instituição desta ceia literalmente, segundo a forma que nosso Senhor Jesus Cristo nos prescreveu, admoestando o povo quanto à morte e paixão do nosso Senhor. E mesmo, como diz santo Agostinho, a consagração é a palavra de fé que é pregada e recebida em fé. Pelo que, segue-se que as palavras secretamente pronunciadas sobre os sinais não podem ser a consagração como aparece da instituição que nosso Senhor Jesus Cristo deixou aos seus apóstolos, dirigindo suas palavras aos seus discípulos presentes, aos quais ordenou tomar e comer.
VIII. O santo sacramento da ceia não é alimento para o corpo como para as almas (porque nós não imaginamos nada de carnal, como declaramos no artigo quinto) recebendo-o por fé, a qual não é carnal.
IX. Cremos que o batismo é sacramento de penitência, e como uma entrada na igreja de Deus, para sermos incorporados em Jesus Cristo. Representa-nos a remissão de nosso pecados passados e futuros, a qual é adquirida plenamente, só pela morte de nosso Senhor Jesus. De mais, a mortificação de nossa carne aí nos é apresentada, e a lavagem, representada pela água lançada sobre a criança, é sinal e selo do sangue de nosso Senhor Jesus, que é a verdadeira purificação de nossas almas. A sua instituição nos é ensinada na Palavra de Deus, a qual os santos apóstolos observaram, usando de água em nome do Pai, do Filho e do Santo Espírito. Quanto aos exorcismos, abjurações de Satanás, crisma, saliva e sal, nós os registramos como tradições dos homens, contendo-nos só com a forma e instituição deixada por nosso Senhor Jesus.
X. Quanto ao livre-arbítrio, cremos que, se o primeiro homem, criado à imagem de Deus, teve liberdade e vontade, tanto para o bem como para o mal, só ele conheceu o que era livre arbítrio, estando em sua integridade. Ora, ele nem apenas guardou este dom de Deus, assim como dele foi privado por seu pecado, e todos quantos descendem dele, de sorte que nenhum da semente de Adão tem uma centelha do bem. Por esta causa, diz São Paulo, o homem natural não entende as coisas que são de Deus. E Oséias clama aos filhos de Israel: “Tua perdição é de ti, ó Israel”. Ora isto entendemos do homem que não é regenerado pelo Espírito Santo. Quanto ao homem cristão, batizado no sangue de Jesus Cristo, o qual caminha em novidade de vida, nosso Senhor Jesus Cristo restitui nele o arbítrio, e reforma a vontade para todas as boas obras, não todavia em perfeição, porque a execução de boa vontade não está em seu poder, mas vem de Deus, como amplamente este santo apóstolo declara, no sétimo capítulo de romanos, dizendo: “Tenho o querer, mas em mima não se acha o realizar”. O homem predestinado para a vida eterna, embora peque por fragilidade humana, todavia não pode cair em impenitência. A este propósito, S. João diz que ela não peva, porque a eleição permanece nele.
XI. Cremos que pertence só à Palavra de Deus perdoar os pecados, da qual, como diz santo Ambrósio, o homem é apenas o ministro; portanto, se ele condena ou absolve, não é ele, mas a Palavra de Deus que ele anuncia. Santo Agostinho, neste lugar diz que não é pelo mérito dos homens que os pecados são perdoados, mas pela virtude do Santo Espírito. Porque o Senhor dissera aos seus apóstolos: “recebei o Santo Espírito;” depois acrescenta: “Se perdoardes a alguém os seus pecados,” etc. Cipriano diz que o servo não pode perdoar a ofensa contra o Senhor.
XII. Quanto à imposição das mãos, essa serviu em seu tempo, e não há necessidade de conservá-la agora, porque pela imposição das mãos não se pode dar o Santo Espírito, porquanto isso só a Deus pertence. No tocante à ordem eclesiástica, cremos que S. Paulo dela escreveu na primeira epístola a Timóteo, e em outros lugares.
XIII.A separação entre homem e mulher legitimamente unidos por casamento não se pode fazer senão por cauda do adultério, como nosso Senhor nos ensina (Mateus 19:5). E não somente se pode fazer a separação por essa causa, mas também, bem examinada a causa perante o magistrado, a parte não culpada, se não podendo conter-se, deve casar-se, como São Ambrósio diz sobre o capítulo sete da Primeira Epístola aos Coríntios. O magistrado, todavia, deve nisso proceder com madureza de conselho.
XIV. São Paulo, ensinando que o bispo deve ser marido de uma só mulher, não diz que não lhe seja lícito tornar a casar, mas o santo apóstolo condena a bigamia a que os homens daqueles tempos eram muito afetados; todavia, nisso deixamos o julgamento aos mais versados nas Santas Escrituras, não se fundando a nossa fé sobre esse ponto.
XV. Não é licito votar a Deus, senão o que ele aprova. Ora, é assim que os votos monásticos só tendem à corrupção do verdadeiro serviço de Deus. É também grande temeridade e presunção do homem fazer votos além da medida de sua vocação, visto que a santa Escritura nos ensina que a continência é um dom especial (Mateus 15 e 1 Coríntios 7). Portanto, segue-se que os que se impõem esta necessidade, renunciando ao matrimônio toda a sua vida, não podem ser desculpados de extrema temeridade e confiança excessiva e insolente em si mesmos. E por este meio tentam a Deus, visto que o dom da continência é em alguns apenas temporal, e o que o teve por algum tempo não o terá pelo resto da vida. Por isso, pois, os monges, padres e outros tais que se obrigam e promovem viver em castidade, tentam contra Deus, por isso que não está neles o cumprir o que prometem. São Cipriano, no capítulo onze, diz assim: “Se as virgens se dedicam de boa vontade a Cristo, perseverem em castidade sem defeito; sendo assim fortes e constantes, esperem o galardão preparado para a sua virgindade; se não querem ou não podem perseverar nos votos, é melhor que se casem do que serem precipitadas no fogo da lascívia por seus prazeres e delícias”. Quanto à passagem do apóstolo S. Paulo, é verdade que as viúvas tomadas para servir à igreja, se submetiam a não mais casar, enquanto estivessem sujeitas ao dito cargo, não que por isso se lhes reputasse ou atribuísse alguma santidade, mas porque não podiam bem desempenhar os deveres, sendo casadas; e, querendo casar, renunciassem à vocação para a qual Deus as tinha chamado, contudo que cumprissem as promessas feitas na igreja, sem violar a promessa feita no batismo, na qual está contido este ponto: “Que cada um deve servir a Deus na vocação em que foi chamado”. As viúvas, pois, não faziam voto de continência, senão porque o casamento não convinha ao ofício para que se apresentavam, e não tinha outra consideração que cumpri-lo. Não eram tão constrangidas que não lhes fosse antes permitido casar que se abrasar e cair em alguma infâmia ou desonestidade. Mas, para evitar tal inconveniência, o apóstolo São Paulo, no capítulo citado, proíbe que sejam recebidas para fazer tais votos sem que tenham a idade de sessenta anos, que é uma idade normalmente fora da incontinência. Acrescenta que os eleitos só devem ter sido casados uma vez, a fim de que por essa forma, tenham já uma aprovação de continência.
XVI. Cremos que jesus Cristo é o nosso único Mediador, intercessor e advogado, pelo qual temos acesso ao Pai, e que, justificados no seu sangue, seremos livres da morte, e por ele já reconciliados teremos plena vitória contra a morte. Quanto aos santos mortos, dizemos que desejam a nossa salvação e o cumprimento do Reino de Deus, e que o número dos eleitos se complete; todavia, não nos devemos dirigir a eles como intercessores para obterem alguma coisa, porque desobedeceríamos o mandamento de Deus. Quanto a nós, ainda vivos, enquanto estamos unidos como membros de um corpo, devemos orar uns pelos outros, como nos ensinam muitas passagens das Santas Escrituras.
XVII. Quanto aos mortos, São Paulo, na Primeira Epístola aos Tessalonicenses, no capítulo quatro, nos proíbe entristecer-nos por eles, porque isto convém aos pagãos, que não tem esperança alguma de ressuscitar. O apóstolo não manda e nem ensina orar por eles, o que não teria esquecido se fosse conveniente. S. Agostinho, sobre o Salmo 48, diz que os espíritos dos mortos recebem conforme o que tiverem feito durante a vida que se nada fizeram, estando vivos, nadam recebem, estando mortos.
Esta é a resposta que damos aos artigos por vós enviados, segundo a medida e porção da fé, que Deus nos deu, suplicando que lhe praza fazer que em nós não seja morta, antes produza frutos dignos de seus filhos, e assim, fazendo-nos crescer e preservar nela, lhe rendamos graças e louvores para sempre. Assim seja. [7]
Ouça o episódio especial do Teologicamente sobre a confissão, ouça aqui.
[1] TRUEMAN, CARL e KIM, EUNJIN. Os Reformadores e suas Reformas, p.123. [2] APONTAMENTOS SOBRE A HISTÓRIA DAS IGREJAS CRISTÃS E OS LIVROS PROFÉTICOS DA BÍBLIA. A antecipação católica, pp.93,94. [3] GIRALDI, LUIZ ANTONIO. A Bíblia no Brasil Colônia (1500-1808), p.50. [4] GIRALDI, LUIZ ANTONIO. A Bíblia na “França Antártica” (1555-1560), p.52. [5] RA – Versão Revista e Atualizada da tradução de João Ferreira de Almeida. [6] GIRALDI, LUIZ ANTONIO. A Bíblia na “França Antártica” (1555-1560), p.53. [7] FERREIRA, PAULO. A confissão de fé de Guanabara (1558) Jean de Bourdel, Matthew Verneuil, Pierre Bourdon e André La Fon, pp.93-99.
Bibliografia: (Org.), Editora InterSaberes. Apontamentos sobre a história das igrejas cristãs e os livros proféticos da Bíblia. Curitiba: InterSaberes, 2015. Barret, Matthew. Teologia da Reforma. 1. Edição: Matthew Barret. Tradução: Francisco Nunes. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2017. Ferreira, Paulo. A Reforma em quatro tempos. 1. Rio de Janeiro: CPAD, 2017. Giraldi, Luiz Antonio. A Bíblia no Brasil Império. 1. Barueri, SP: Sociedade Biblica do Brasil, 2012.