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Oração Pelos Mortos(16 min de Leitura)

Certa vez, assim disse o grande pregador Leonard Ravenhill: “Alguém me perguntou: ‘você ora pelos mortos?’ Não! Eu prego para eles.” Neste texto, não pretendo nem orar e nem pregar, mas responder a estes mortos que dizem ser lícito orar por aqueles. Creio que, entre aqueles que incitam qualquer tipo de oração pelos mortos, muitos atualmente se encontram mortos espiritualmente, mesmo que pareçam bastante vivos. Na verdade, algumas vezes é possível sentir o fedor putrefato de alguns líderes que, invés de se permitir ser comido pelos vermes, exalam o odor pútrido que sai através das palavras de morte de seus lábios. Este texto é, então, uma forma de responder a estes mortos, com a esperança de que, em Cristo, sejam vivificados.

Vez ou outra nos deparamos com perguntas a respeito da oração tanto pelos mortos quanto aos mortos. Esperamos que estas sejam feitas apenas por leigos, uma vez que os cristãos que estudam a Bíblia logo entendem que não é possível se comunicar com aqueles que já partiram. Mas quanto à oração pelos mortos, esse ensino é muitas vezes propagado por uma certa quantidade de líderes romanistas, sejam católicos ou de outras vertentes do cristianismo. Aliás, conforme postula abaixo o pastor Renato Vargens, essa crença se fundamenta principalmente em um livro apócrifo:

“A Bíblia é absolutamente clara ao afirmar que, após a morte, só nos resta o juízo. As Escrituras nos ensinam também que, toda e qualquer decisão por Cristo, só pode ser tomada em vida, o que, por conseguinte, nos leva a entender que não existe fundamento teológico para interceder a favor dos mortos. Para os católicos romanos, a referência bíblica que fundamenta esta prática encontra-se em 2 Macabeus 12:44. Entretanto, nós protestantes não reconhecemos a canonicidade deste livro, e nem tampouco a legitimidade desta doutrina, uma vez que o Protestantismo não se submete às tradições católicas e sim às doutrinas das Sagradas Escrituras.” [1]

Recentemente, deparei-me com mais um ensino antibíblico no qual um líder anglicano incita oração pelos que já morreram. Assim se encontra a sua formulação:

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“A questão da oração pelos mortos é bem simples: — A Bíblia manda orar por todos os homens (1Tm 2:1) e por todos os cristãos (Ef 6:18), num mundo judeu e pagão em que era comum orar pelos mortos. Você pode supor que esses textos se referem apenas aos vivos, mas é suposição sua. — Paulo mostra que era possível esperar pela misericórdia no juízo, em oração (2Tm 1:18). — Paulo usa a intercessão pelos mortos como argumento em favor da ressurreição (1Co 15:29). — Para as tradições cristãs que usam os deuterocanônicos (como a anglicana), a presença de intercessões pelos mortos neles significa que essa prática não é herética.”

Diante disso, meu propósito é trazer a saudável intepretação dos textos citados, a fim de dirimir as dúvidas daqueles que se encontram indecisos quanto ao ensino bíblico.

O primeiro texto é 1 Timóteo 2.1, que diz o que segue:

“Admoesto-te, pois, antes de tudo, que se façam deprecações, orações, intercessões, e ações de graças, por todos os homens

O apóstolo Paulo escreve a sua carta a Timóteo a fim de orientá-lo quanto a uma série de questões doutrinárias surgidas na igreja de Éfeso, onde Paulo deixou Timóteo. E uma dessas questões levantadas pelos falsos mestres era sobre a oração. Por isso, Paulo diz como deve ser a oração pública. Sobre esse verso, assim diz João Calvino:

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“Primeiramente, ele trata da oração pública e de sua regulamentação, a saber: que ela deve ser feita não só em favor dos crentes, mas em favor de todo o gênero humano. É possível que alguém argumente: ‘Por que devemos preocupar-nos com o bem-estar dos incrédulos, já que não mantêm nenhuma relação conosco? Não é suficiente que nós, que somos irmãos, oremos uns pelos outros e encomendemos a Deus toda a Igreja? Os estranhos não significam nada para nós’. Paulo se põe contra essa perversa perspectiva, e diz aos efésios que incluíssem em suas orações todos os homens, e não as restringissem somente ao corpo da Igreja.”[2]

O verso dois indica a extensão da oração:

“Pelos reis, e por todos os que estão em eminência, para que tenhamos uma vida quieta e sossegada, em toda a piedade e honestidade;”

O ensino para a igreja de Éfeso era que a oração deles não deveria se limitar aos cristãos apenas, mas inclusive por aqueles que são maus, como o imperador Nero. Não encontramos nenhuma referência a oração pelos mortos neste texto. Creio que o autor que colocou esse primeiro verso do segundo capítulo da primeira carta a Timóteo o tenha colocado de modo geral a fim de criar uma base para os textos viriam a seguir. Portanto, vejamos o segundo texto apresentado pelo autor:

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“Orando em todo o tempo com toda a oração e súplica no Espírito, e vigiando nisto com toda a perseverança e súplica por todos os santos”

Efésios 6:18)

Esse é o conhecido texto que nos ordena a nos revestirmos de toda armadura de Deus, como “o capacete da salvação e a espada do Espírito, que é a palavra de Deus.” (Efésios 6.17). No verso 18, tendo finalizado o processo do revestimento da armadura, eis que se inicia a guerra com o exercício da oração por todos os santos. Segundo o autor que ensina a oração pelos mortos, esse “todos os santos” no final do verso contempla também os mortos. Nada mais absurdo! Na mesma carta, no primeiro capítulo, verso 15, assim diz Paulo:

“Por isso, ouvindo eu também a fé que entre vós há no Senhor Jesus, e o vosso amor para com todos os santos”

Efésios 1:15)

Se o referido autor for coerente com sua interpretação, deve assumir que Paulo estava diante de pessoas que expressavam amor pelos mortos. Paulo ouvir sobre a fé daqueles cristãos, bem como a forma linda como amavam também os mortos. Ora, sabemos que é uma leitura tão impossível quanto é dizer que em 6.18 Paulo orienta oração pelos mortos. Recomendo que o autor estude aquilo que chamamos de exegese, algo que nos ajuda a olhar todo o contexto de um texto.

Sigamos para o próximo texto. Assim diz 2 Timóteo 1.18:

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“O Senhor lhe conceda que naquele dia ache misericórdia diante do Senhor. E, quanto me ajudou em Éfeso, melhor o sabes tu.”

Paulo, mais uma vez, está a orientar Timóteo. Já sabemos o contexto. O apóstolo lembra a Timóteo sobre aqueles que o abandonaram em momentos de tribulação (v.15). Além disso, nos dois versos seguintes, Paulo se recorda de Onesíforo, um dos poucos que o ajudou em sua caminhada cristã. Finalmente, no verso 18, Paulo registra seu desejo de que Onésíforo encontre misericórdia de Deus quando o Último Dia chegar.

Até onde compreendo, o autor que defende a oração aos mortos sugere que Onesíforo ou estava morto ou, ainda que morresse sem fé, poderia encontrar a fé numa espécie de purgatório. Bastariam as orações dos santos vivos por ele. Quanto a primeira possibilidade, o verso 19 do capítulo 4 registra uma saudação do apóstolo “a casa de Onesíforo”. Tudo indica que ele estivesse ainda vivo.

No que concerne à segunda opção, além de ser contrária à Escritura, é carente de uma básica interpretação de texto. Paulo apenas menciona sua gratidão a Onesíforo e depois intercede para que ele seja um salvo. Quando se deu essa intercessão? No tempo presente. Quando seria a manifestação da salvação? No Último Dia. O que temos nesse texto é apenas uma descrição de que a misericórdia do tempo presente aos eleitos também seria manifesta no Dia Final. Em Romanos 8.19, encontramos o seguinte texto: “a ardente expectação da criatura espera a manifestação dos filhos de Deus.” Neste texto, Paulo diz que a criação espera que chegue o Dia Final para que todos os eleitos sejam revelados. Há um sentido em que apenas no Final saberemos de fato quem são os verdadeiros salvos. No texto de Paulo sobre Onesíforo, podemos perceber esse desejo do apóstolo de que seu amigo seja confirmado como eleito no Último Dia. Qual cristão não pensa assim a respeito daqueles a quem ele ama?

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Novamente, não encontramos nenhuma referência mínima sobre oração pelos mortos. Prossigamos para o próximo texto:

“Doutra maneira, que farão os que se batizam pelos mortos, se absolutamente os mortos não ressuscitam? Por que se batizam eles então pelos mortos?”

1 Coríntios 15:29

Sobre esse texto, o autor que ora pelos mortos diz que “Paulo usa a intercessão pelos mortos como argumento em favor da ressurreição.” Vejamos, contudo, o contexto do capítulo 15 de 1 Coríntios.

Paulo está a falar sobre a ressurreição dos mortos, e respondendo a alguns membros da igreja de Corinto que não cria na ressurreição (v.12). No verso em questão, 29, Paulo apresenta e contesta outro absurdo: a prática de batismo em favor dos mortos. Muito provavelmente havia entre os coríntios aqueles que praticavam o batismo em favor da salvação dos que já haviam partido. Com base nisso, o argumento de Paulo era: se não há ressurreição dos mortos, de que vale esse tal batismo em favor dos que já foram? Ou seja, se não há uma crença na ressurreição, não há sentido em realizar batismo pelos mortos.

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Paulo não aprova essa prática de batismo, mas apenas levanta uma indagação a partir da negação da ressurreição. Além disso, uma boa interpretação linguística permite o leitor perceber que no verso 29 Paulo usa a terceira pessoa (“os que se batizam pelos mortos”), enquanto no verso 30 usa a primeira pessoa do plural “nós”. É evidente que Paulo não se coloca nessa prática de batismo pelos mortos, mas a reprova usando o argumento da ressurreição.

Voltemos à citação do autor defensor dos mortos. Ele diz: “Paulo usa a intercessão pelos mortos como argumento em favor da ressurreição.”. Isso é verdade. Mas onde está a aprovação dessa intercessão? Notamos pelo contexto que o apóstolo está, no capítulo 15, combatendo algumas falsas crenças no que tange aos mortos e à ressurreição. Ademais, todo o contexto da Sagrada Escritura aponta para apenas “uma chance” de salvação em vida, vindo o juízo após a morte. Mais uma vez contribui Renato Vargens:

“Ora, a Bíblia nos diz que a salvação de uma pessoa depende única e exclusivamente da sua fé na Graça salvadora que há em Cristo Jesus. Ela também nos ensina que esta fé precisa ser declarada durante sua vida na terra (Hebreus 7:24-27; Atos 4:12; 1 João 1:7-10) e que, após a morte, a pessoa passa diretamente pelo juízo (Hebreus 9:27) e vivos e mortos não podem comunicar-se de maneira alguma (Lucas 16:10-31). Ora, do ponto de vista bíblico, é inaceitável acreditar que os mortos estejam no purgatório ou no limbo, aguardando uma segunda oportunidade para a salvação. Em hipótese alguma nós como cristãos devemos celebrar ou participar de culto aos mortos, antes, pelo contrário, fomos e somos chamados a anunciar aos vivos, a vida que somente podemos experimentar em Cristo Jesus.”[3]

Portanto, em nenhum dos textos citados pelo autor orador pelos mortos encontramos alguma aprovação dessa prática. Uma mínima aprovação deve-se a fundamentos extrabíblicos. Todo cristão genuíno rechaça qualquer vestígio de intercessão por aqueles que já se foram, uma vez que após o último fôlego ocorre o juízo. Dizer que ocorre o juízo é confirmar que já no estado intermediário, antes da ressurreição do corpo, o destino da pessoa, selado antes da fundação do mundo, já se encontra completamente definido, não sendo possível nenhuma oração mudar.

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Se oração de cristão não muda o destino dos mortos, muito menos orações de mortos espirituais. Não digo que todos os que praticam esse ato são ímpios, pois muitos podem apenas estar no engano temporário, mas digo que a maior parte, sobretudo os líderes, se encontram nesse terrível estado. Muitos destes não apenas estão mortos, mas também exalando por aí odores putrefatos.

Nosso desejo como cristão é que nosso bondoso Deus tenha misericórdia dos que ainda vivos biologicamente, mas mortos em seu espírito, oram pelos mortos biologicamente. Ou os sepulte de uma vez!

[1] Disponível em <https://pleno.news/opiniao/renato-vargens/posso-orar-pelos-mortos.htm> [2] Disponível em <http://www.monergismo.com/textos/jcalvino/1timoteo2_1-4_calvino.htm> [3] Disponível em <https://pleno.news/opiniao/renato-vargens/posso-orar-pelos-mortos.html>

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Rodrigo Caeté

Rodrigo Caete é Pós-Graduado em Teologia Bíblica pelo Centro Presbiteriano Andrew Jumper (Mackenzie); Graduado em Teologia pelo Seminário Teológico Congregacional de Niterói; Mestrando pelo Instituto Reformado Santo Evangelho; Licenciado em Letras pela Universidade Federal do Rio de Janeiro; Pastor da UIECB. É autor dos livros "Púlpito Feminino", "O Cálice do Evangelho", "O cálice da ira sem mistura" e "Pregadores nas mãos de um Deus irado".

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